A árdua missão policial fielmente desempenhada e tão cobrada pela sociedade brasileira continua sendo incompreendida por muitos. Os caminhos tortuosos e espinhosos seguidos pelas policias parecem ser intransponíveis e intermináveis.
Infelizmente há ainda uma tradição arraigada no âmago do povo em generalizar que a Polícia é ineficiente e corrupta, que os nossos policiais são ignorantes, irresponsáveis, arbitrários e criminosos, por isso muitos até torcem pelo nosso fracasso.
Para boa parte da população policial é sinônimo de bandido, de algo imprestável, um reles ser do submundo da sociedade e pouco se importam com os seus problemas, ou seja, são tais pessoas insensíveis na vida e até na morte dos nossos policiais.
Quando morre um policial na maioria dos países desenvolvidos ocorre um verdadeiro desfile de despedida pelas principais avenidas da cidade em agradecimento aos seus relevantes serviços prestados à sociedade, com o seu caixão exposto em caminhão do Corpo dos Bombeiros, sirenes e batedores dos carros policiais ligados, seus colegas trajando farda de gala, com a presença dos chefes de Polícia, Prefeito, Governador e demais autoridades, além da cobertura da imprensa local. A população pára tudo o que está fazendo e aplaude homenageando a passagem do féretro do herói morto com muita comoção.
A viúva e seus filhos nunca são desamparados pelo Estado, muito pelo contrário, além da pensão justa relativa ao próprio digno salário do morto, ainda recebem bons seguros de vida que obrigatoriamente são feitos pelo poder público e, quando morrem em serviço defendendo o povo, aí é que esses valores duplicam.
Entretanto, quando morre um policial aqui no nosso País, mesmo em serviço, defendendo a sociedade dos criminosos não aparece autoridade alguma, somente a presença dos seus familiares, amigos ou colegas de profissão e, em ocasiões especiais os chefes de Polícia. Imprensa só de quando em vez faz a cobertura do evento fúnebre.
Até o próprio povo se impacienta e se chateia quando os colegas do policial morto querem lhes prestar uma condigna última homenagem, como foi um caso recente ocorrido aqui na nossa região em que um policial civil ao interferir num assalto fora abatido pelos marginais e, no seu cortejo fúnebre bem organizado com a Polícia Militar parando o trânsito até o cemitério, escutei perfeitamente de um motorista apressado que estava numa rua paralela sem poder passar por alguns instantes e que falou em alto e bom som: QUANTA PALHAÇADA. ATÉ NA MORTE ELES ATRAPALHAM O TRÂNSITO!... Outros motoristas, motociclistas ou transeuntes apenas assistiam com semblante alheio, raivoso, indiferente ou insensível o cortejo passar “atrapalhando o trânsito” e atrapalhando os seus preciosos tempos...
Nossos policiais e seus familiares não são apenas abandonados, desprezados e renegados por grande parte da sociedade, são de igual modo, tratados em descaso pelo Poder público. Em vida são humilhados e desvalorizados profissionalmente com salários não condizentes com a importância do cargo. Na morte, além dos desprezos citados, os herdeiros que possuem direitos aos seus baixos salários transformados em pensões são até diminuídos com a perda de certas gratificações, fato que também ocorre quando os policiais são feridos em batalha contra o crime e ficam inválidos para o resto das suas vidas. De pronto perdem logo o adicional noturno e a gratificação de periculosidade, quando o certo, por uma questão de gratidão e justiça era incorporar tais gratificações nas suas pensões.
O policial vê mais sofrimento, sangue, problemas e alvoradas do que qualquer outra pessoa. Trabalha independente das condições de tempo ou de lugar, mas a sua maneira de ver a vida em proteção da sociedade continua a mesma apesar dos percalços na sua caminhada. Na maioria das vezes é entristecido por conta das desilusões encontradas, mas no fundo é um forte, sempre esperando por um mundo melhor.
A sociedade brasileira precisa confiar mais na sua Polícia. Tem que ver e sentir a Polícia à luz do valor da amizade, pois os nossos policiais lutam o morrem por ela em busca paz social, enquanto que, por sua vez, o poder público deve ver a Polícia como valorosa instituição pagando salários dignos aos seus membros, como já ocorre em raros Estados da Nação, assim valorizando e respeitando-os na vida e na morte.
Autor: Archimedes Marques (delegado de Policia no Estado de Sergipe. Pós-Graduado em Gestão Estratégica de Segurança Pública pela UFS)